Vai um Suco de Laranja?

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VAI UM SUCO DE LARANJA?
Não!!! A ANVISA informou que a laranja oferece um risco agudo de 12%, podendo causar dano à saúde em 24 horas. Ao pronunciar isso, a apresentadora mostrou uma larga faixa de pano com a seguinte expressão “LARANJA – CAMPEÃ DOS AGROTÓXICOS”. E falou mais alguns minutos sobre o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos, o PARA.
Essa cena é verídica, aconteceu em um programa de TV com boa audiência.
De imediato, percebemos o possível impacto sobre o consumo de laranja, mas também, ficamos intrigados, pois ao anunciar os resultados do PARA de 2013 a 2015 a ANVISA deu explicações em comunicados e notas técnicas, e em nenhum momento deixou transparecer que a laranja seria tão vilã.
Passamos a estudar o assunto. Realmente, na tabela mais divulgada pela Agência, a laranja aparece no topo, tendo apresentado em 90 amostras (das 744 analisadas) potencial de risco agudo, número este que representa 12,1% de amostras com esse tipo de risco.
Para o público em geral, convenhamos, é um número alto, pois a leitura leva a imaginar um risco igual a 12,1% de sentir algum problema de saúde nas próximas 24 horas, após a ingestão do delicioso suco. Vamos saber mais.
Em verdade o Potencial de Risco Agudo constata que um indivíduo precisa consumir uma grande quantidade de alimento, com resíduos de determinado agrotóxico, em um período de 24 horas para que esteja exposto a uma situação de risco.
A exposição aguda é a estimativa da exposição máxima de um indivíduo a resíduos de agrotóxicos em alimentos consumidos em um período de 24 horas, expressa em miligrama de resíduo por quilograma de peso corpóreo por dia (mg/kg p.c. / dia).

O indivíduo não pode ultrapassar a Dose de Referência Aguda (DRfA) de determinado produto, ou seja, não pode ingerir alimentos em 24 horas acima deste nível pois pode haver dano à saúde. É expressa em mg/kg de peso corpóreo.

Para comparar com a DRfA e saber se há risco é preciso calcular a Ingestão Máxima Estimada Aguda (IMEA). Esse parâmetro é definido como a quantidade máxima estimada de resíduo de determinado produto no alimento específico consumido em até 24 horas. É expresso em mg/kg de peso corpóreo. A quantidade de alimento consumida é um dado definido na Pesquisa de Orçamento Familiares realizada pelo IBGE.

Quando a IMEA é maior que a DRfa entramos na faixa de risco.

O resíduo que foi encontrado na laranja e que levou ao potencial de risco de 12% foi do produto Carbofuran. Só esse ingrediente ativo foi responsável por 11%. Ora, você pode imaginar que houve erro, pois esse ingrediente ativo não é recomendado para laranja. Acontece que o produto pode ter sido usado indevidamente, o que é pouco plausível em razão da tecnificação da cultura, ou, o resíduo ser resultante da degradação do Carbossulfan, que se transforma posteriormente em Carbofuran, sendo este um motivo bem viável. E mais, a DRfA do Carbofuran é baixíssima, exatos 0,00015 mg/kg de peso corpóreo / dia, segundo a Autoridade Europeia de Segurança Alimentar – EFSA. Os dados do monitoramento revelam que os resíduos encontrados que extrapolam a DRfA ficaram entre 0,01 e 0,06 mg/kg, sendo que os mais frequentes estão próximos a 0,02 mg/kg de laranja, e a IMEA calculada pela ANVISA ao redor de 0,000355, portanto bem acima da DRfA, daí a reprovação.

A única constatação que joga dúvida sobre o real risco do copo de suco da apresentadora é o fato da quantidade de resíduos utilizada para os cálculos ser proveniente de toda a laranja e o suco é feito só com a polpa. Na polpa fica apenas o percentual de 10% dos resíduos, os outros 90 % ficam na casca.

Diante destes dados a atitude do governo deve ser de precaução e alerta. Agora é trabalhar para verificar as causas e corrigi-las. Alíás, na lista PIC (Produção Integrada dos Citros) já não consta a recomendação para Carbofuran e Carbossulfan. Cabe ainda informar que o ingrediente ativo Carbofuran está em fase de Reavaliação na ANVISA, com o desfecho previsto para este ano.

Essa situação relatada é, como se diz, um ponto fora da curva, pois lidamos aqui com uma substância de risco elevado. Com os produtos realmente recomendados e usados em laranja não temos este tipo de problema.

Por último é importante lembrar que esta nova forma de comunicar os possíveis efeitos danosos dos agroquímicos é a atualmente adotada nos países que fazem esse monitoramento dos resíduos. Até então, a ANVISA apontava apenas as irregularidades (ultrapassagem de limites de resíduos e produtos usados em culturas sem autorização). Essas irregularidades continuam sento observadas, para que medidas educacionais sejam tomadas, mas são de tal ordem que os riscos à saúde não causam sobressaltos.

Eng. Agr. Tulio Teixeira de Oliveira – Diretor Executivo da AENDA
www.aenda.org.br / aenda@aenda.org.br
Janeiro.2017

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