Temos alertado ano após ano que o sistema brasileiro de registro de pesticidas sofre de overdose de burocracia e por isso fica emperrado. As filas de espera só crescem. Ano passado mostramos ao leitor (ENFIM, O CAOS) que o último processo na fila (eram 395 processos em jul2011) dos pleitos de Produto Técnico Equivalente seria atendido em mais de 9 anos, a continuar a média do rendimento burocrático (42 processos analisados por ano).
Agora, em out/2012, a ANVISA disponibilizou o novo tamanho desta fila em seu portal eletrônico, e muitos deram entrada em 2009. São 450 pleitos, e o último será analisado daqui a 11 anos e alguns meses, considerando a média anual histórica de produtos analisados. Se for considerada a média de 2011, que foi a melhor = 72 processos/ano, o último processo da fila será analisado daqui a 6 anos e alguns meses, ou seja, no ano de 2018. O produto poderá já estar ultrapassado e o investimento da empresa virado fumaça.
A fila relatada acima diz respeito apenas ao registro de produtos genéricos. Existe ainda a fila dos produtos novos no Brasil, a fila dos produtos genéricos que não se enquadram na equivalência química, a fila dos produtos biológicos, a fila dos produtos para agricultura orgânica e a fila dos pleitos pós-registros.
O colapso do sistema fica evidenciado também com a extensão da fila de pleitos pós- registro, pois são processos de simples alterações nos registros já avaliados. A listagem de outubro apresenta 547 processos e as alterações podem ser: (1) alteração da razão social; (2) alteração de dose; (3) alteração de formulação; (4) alteração de intervalo de segurança; (5) alteração de rótulo e bula; (6) alteração de monografia; (7) alteração de forma de apresentação; (8) cancelamento de pleito de alteração; (9) correção de informe de avaliação toxicológica; (10) exclusão de embalagem; (11) exclusão de fabricante; (12) exclusão de formulador; (13) inclusão de alvo biológico; (14) inclusão de cultura; (15) inclusão de embalagem; (16) inclusão de fabricante; (17) inclusão de formulador; (18) inclusão de importador; (19) inclusão de manipulador; (20) inclusão de modalidade de aplicação; (21) alteração em produto formulado; (22) alteração em produto técnico; (23) reclassificação toxicológica.
Métodos burocráticos são inevitáveis e necessários, pois regras de procedimentos e conceitos técnico-científicos devem ser seguidos igualitariamente por todos. O mal maior do sistema brasileiro de registro de pesticidas já foi identificado. É o exame de cada processo por órgãos espalhados em três ministérios distintos: CGAA/DFIA do Ministério da Agricultura-MAPA, GGTOX/ANVISA do Ministério da Saúde-MS e DIQUA/IBAMA do Ministério do Meio Ambiente-MMA.
E esse formato foi instituído de forma ilegal, posto que o Decreto 4074/2002 não seguiu os ditames da Lei 7802/1989, que estabeleceu: Art. 3º Os agrotóxicos, seus componentes e afins, de acordo com definição do art. 2º desta Lei, só poderão ser produzidos, exportados, importados, comercializados e utilizados, se previamente registrados em órgão federal, de acordo com as diretrizes e exigências dos órgãos federais responsáveis pelos setores da saúde, do meio ambiente e da agricultura.
O legislador claramente (ver também Art. 2º da Lei 7802) determinou que os produtos de uso agrícola fossem examinados no MAPA, de acordo com diretrizes e exigências descritas pelo MS e MMA. Por sua vez, os produtos de uso não agrícola fossem examinados no MMA e os produtos de uso urbano fossem examinados no MS. Nada de avaliação tripartite. A Caesar o que é de Caesar.
Essa simples mudança no Decreto 4074 permitiria uma análise mais célere desses produtos, que promovem a sustentação das colheitas agrícolas mais fartas; sem eles as pragas consumiriam mais de 40% dos alimentos ainda no campo; que permitem salvaguardar de incêndios o entorno das grandes linhas de transmissão elétrica através da capina química do matagal que se forma ao longo do sistema; e, que nos livram de baratas, ratos e outras pragas, quando em demasia no meio urbano. Cessaria de pronto as eternas divergências entre os três órgãos na busca da harmonização de procedimentos e diminuiriam as interferências políticas de toda ordem. A queda do muro da demora nas avaliações desses produtos não daria margem a situações vexatórias, como as suspeitas de corrupção para obtenção de vantagens que estamos assistindo neste final de 2012 e que tanto abalam a imagem do nosso país.
A sociedade vem percebendo essa distorção do sistema de registro. Associações e Confederações ligadas ao setor produtivo agrícola têm reclamado com insistência e entidades do setor empresarial enfatizam a morosidade do registro, em todas as instâncias do Poder Executivo. O Poder Legislativo, por seu turno, na pessoa do Dep. Fed. Antonio Balhmann, preocupado com a falta de produtos para a área de fruticultura nordestina, analisou com profundidade as causas e concluiu pela necessidade de um novo formato. Em requerimento formal da Câmara Federal entregou em abril deste ano uma moção à Casa Civil postulando pela criação de uma Agência de Agroquímicos. Um único órgão reuniria técnicos em agricultura, ecologia e toxicologia, voltados para a análise dos processos relativos aos registros desses produtos. Um só comando, seguindo as diretrizes emanadas daqueles Ministérios, com certeza teria capacidade e autoridade gerencial para corrigir de vez a inaceitável demora de hoje.
Mas, por favor, usem uma burocracia positiva; este assunto não precisa de uma nova lei que pode levar uma década para ser aprovada, – é só alterar o Decreto existente. E, não esqueçam, acabem com o Comitê de Assessoramento para Agrotóxicos, instância com função de harmonização do sistema (art. 95 do Decreto), mas que se mostra improdutiva, até mesmo antifuncional, senão inútil. Eng. Agr. Tulio Teixeira de Oliveira – Diretor Executivo da AENDA