PEQUENO GRANDE ERRO
A inserção da ANVISA e do IBAMA no processo de registro dos agrotóxicos, em 1989, foi sem dúvida um grande incremento para o perfeito conhecimento dos assuntos de toxicologia e ecotoxicologia.
Nesses quase 30 anos as normas criadas para essas áreas forçaram as empresas a aumentar o número de colaboradores com mais base técnica em toxicologia, laboratórios nasceram para elaborar os testes em cada produto, universidades reprogramaram suas grades curriculares, congressos e simpósios abriram mais espaço para esses ramos da ciência. O país ganhou em tecnicidade e conhecimento; e surgiu até uma velada concorrência por produtos de menor grau de toxicidade e mais amigáveis ao meio ambiente.
Em 2002, foi introduzido o regime de registro por equivalência para os chamados produtos genéricos; com regras calcadas em níveis de resultados dos testes agudos, proporcionando uma avaliação mais simples dos processos com esses tipos de produtos.
No entanto, a avalanche de pedidos de registro tem sido de tal ordem que uma fila inusitada se formou, de sorte que a espera pode ser de 7 anos para a empresa ter o direito de comercializar o seu produto. O governo só observa há 16 anos esse cenário que, inclusive, desmerece a alta capacidade dos técnicos oficiais. É inconcebível e frustrante.
E pensar que a robótica computacional já poderia ter solucionado isso, visto que a avaliação de produtos genéricos ou com base em ingredientes ativos já registrados é praticamente uma fórmula matemática de pontuações, com pouca margem para dúvidas ou interpretações. Sim, pois mais de 95% da fila é composta por estes tipos de produtos.
Infelizmente, agora talvez não seja mais tão simples esta solução, pois a inventividade burocrática criou nos últimos 2 a 3 anos uma discutível (inédita em todo o planeta) comparação entre produtos. A tese é: um produto não pode ser mais tóxico que outro produto “similar”. A Lei até que aponta para isso, mas em face de novas moléculas, produtos novos, jamais para genéricos; além de ser taxativa: só vale para produtos com a mesma finalidade. Mesma finalidade, por obvio, é para o controle de pragas nas mesmas culturas. Não se sabe bem porque, os advogados estatais inventaram que produto novo nos termos da Lei era qualquer novo produto que solicitasse registro, aliás, contrariando até o Decreto Regulamentador. E os técnicos embarcaram nesta heresia.
O leitor menos afeito ao tema pode perguntar: – mas os produtos já não são separados em classes toxicológicas I, II, III e IV, seja pela ANVISA seja pelo IBAMA? Correto, mas essa separação é feita em relação ao conjunto “ingrediente ativo + componentes”, e, agora querem impor regras aos efeitos toxicológicos dos componentes de uma formulação em relação a componentes de outra formulação, pois como pode um produto de mesmo ingrediente, mesma concentração e mesmo tipo de formulação dar resultados que o enquadra em classe mais tóxica que um seu similar?
Na ANVISA, a comparação ainda não tem regras públicas, mas há reclamações de que já estejam praticando. O que se sabe é que em uma das Consultas Públicas para atualização da avaliação toxicológica existe uma seção para tal comparação entre produtos, pegando carona nas categorias do GHS que estão sendo introduzidas. Na verdade não há muita margem para o assunto, pois os produtos (ingredientes ativos ou componentes) são testados agudamente em apenas um organismo, o rato.
No IBAMA já está ensaiada uma regra mais elaborada, visto que os organismos a serem testados são mais variáveis: microcrustáceos, algas, microorganismos de solo, minhocas, crustáceos, peixes e aves. A fundamentação pode ter uma lógica, mas não respaldada em ciência toxicológica. A análise das diferentes notas dos produtos comparáveis mais parece um jogo de perde-ganha. Mas, já está valendo, pedidos de registro são rejeitados, mesmo sem uma regra estabelecida por normativa devidamente aprovada.
O mais inacreditável ainda é que esses órgãos estão exercitando essa COMPARAÇÃO sem qualquer norma pública estabelecida, jogando no lixo todos os testes toxicológicos e ecotoxicológicos apresentados conforme as normas vigentes e analisados após 7 anos de espera.
Além do desrespeito à Lei, citado mais acima, este tipo de comparação traz uma carga de subjetividade muito grande, pois foge à máxima de que o veneno é função da dose. Entendemos ser mais objetivo fazer um planejamento para verificar a real toxicidade de cada componente à saúde humana e a alguns parâmetros ambientais. Um número de componentes seria testado por ano, a cargo da Indústria e, ao longo de alguns anos teríamos um diagnóstico. Caso o componente seja considerado inaceitável do ponto de vista toxicológico, não poderia mais ser usado. Ponto final.
Mas com agrotóxico o chicote é sempre mais pesado. Lembramos aqui o caso do componente nonil-fenol, que foi escorraçado das formulações de agrotóxicos, e continua sendo usado em produtos para tratamento de cabelo. Era usado também em xaropes medicinais. Não ria, chore.
Eng. Agr. Tulio Teixeira de Oliveira – Diretor Executivo da AENDA |